O Pimpão do Tarroal

 


Hoje ao regressar da minha caminhada, passei junto de uma daquelas casas, que me recordo cheia de vida, cheia de histórias, de memórias, que fizeram parte da vida das gentes da minha terra. Certamente tal como outras, mais dia, menos dia ficará no rol das que fazem parte apenas da memória daqueles que, tal como eu já vão escasseando. Ao ver as paredes e telhados já caídos, lembrei-me de um personagem famoso que lá viveu e a quem eu há cinquenta e tal anos, dediquei uns versos, em boa hora o fiz isso deu.me a possibilidade de agora os partilhar convosco.



Há cá na terra um Pimpão
Com uma sorte danada
Tem namoradas aos montes
Sem ter que se ralar nada

Vêm de longe e de perto
Até de outra freguesia
Por visitar o Pimpão
Já ganharam o seu dia

Ele não se faz esquisito
Brancas, pretas, amarelas
Sempre armado em valentão
Namora com todas elas

À muitos que o invejam
Por ele não trabalhar
Mas sabem lá se não cansa
Todos os dias namorar

Já sabe o valor que tem
É altivo e vaidoso
Namoradeiro, competente
Ele é um Pimpão famoso

Tem filhos por todo o lado
Sustentá-los?nem pensar
Diz que é garboso, bonito
Só nasceu para namorar

Para tudo é preciso sorte
E este não se deu mal
É duma raça apurada
O Pimpão do Tarroal.

Quando comecei a escrever, estava com a intenção de vos deixar um desafio, ver quem descobria quem era este namoradeiro, mas pensei melhor e por várias razões desisti da ideia.

Primeiro porque a maioria dos meus amigos, têm idade para serem meus filhos e desconhecem por completo esta realidade, segundo os amigos, que não nasceram cá, mesmo sabendo que fizeram daqui a sua segunda terra com muito amor e carinho, também não iriam descobrir, quem resta? Os amigos da minha idades e saloios como eu, a esses bastou lerem o nome de Tarroal, p ara lhe chegar um enorme sorriso ao rosto e pensaram. Só mesmo esta Rosa. Digam lá, foi ou não?

Vamos lá então desvendar o mistério.

Vou tentar explicar da melhor maneira para que os mais novos entendam.

O Pimpão, pertença de um senhor chamado Domingos Tarroal, era um bovino exemplar de raça apurada. Ou seja um boi cheio de sorte que nasceu numa época em que ainda não se ouvia falar, pelo menos aqui na minha terra, de inseminação artificial. Como tal a sua vida consistia em passar dias e dias bem regalado no seu canto, sem ter que trabalhar no campo, para assim estar sempre disponível para "fazer favores "às vacas das redondezas. A razão para tal era a seguinte. A maioria das pessoas da terra tinham apenas uma vaca para terem leite para o sustento dos filhos, não tinham possibilidades para sustentar um macho, apenas para a reprodução, como tal quando chegava essa altura, o Pimpão era o responsável pelas gerações seguintes. Trabalho difícil? Seria pago para tal? Julgo que seria só cama e mesa, o que considero muito injusto, mas também nunca ouvi dizer, naquela época que eram justos os ordenados de quem trabalhava. Pronto, lá estou eu.

Muitas histórias teria para contar sobre o Pimpão, mas não encontro as palavras mais adequadas para me expressar sem correr o risco de ferir algumas suscetibilidades de amigos mais pudicos que possam navegar por aqui, está por aí algum?

Mas mesmo assim não resisto a contar como foi a primeira vez que ouvi falar do famoso Pimpão. Teria os meus sete anos, ao assistir a uma zanga entre duas vizinhas, entre muitos nomes bonitos que trocaram, uma delas gritou. Vai mas é ter com o boi do Tarroal. Fui a correr para casa e disse há minha Mãe. Fulana mandou, Beltrana, ir ter com o boi do Tarroal, para quê?? Ó filha é para lhe dar de comer, porque o Ti Domingos está doente. Acreditei, comi e calei".

Ficamos por aqui, mais tarde comecei a entender, que sempre que alguém queria ofender outra pessoa era o nome do Pimpão que vinha à baila.

Gostei de recordar, espero que os amigos também tenham gostado, para os mais velhos, um recordar, para os mais novos espero que tenham gostado de saber estas memórias que fizeram parte da vida dos vossos pais e avós.

Para mim um gosto e uma pontinha de orgulho, por ser filha de quem sou, ser saloia, e por poder estar a partilhar convosco estas vivências que me ajudaram a ser quem sou.

Um bom resto de dia para todos, vamos continuando a nossa luta contra este inimigo, invisível e traiçoeiro que nos ameaça, tentando manter a coragem e a esperança.

Muito obrigada pelo vosso carinho. 

 

 


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