Lápis de cor
Ao mexer numa gaveta encontrei uma caixa e lá dentro encontrei este "material" que fotografei.
São lápis, dirão os meus amigos.
Não, não são.
São memórias, pedaços de vida.
Alguns roídos na ponta, roídos pela vida.
Hoje precisamos de psicólogos para não roer os lápis.
Ainda bem, eles precisam de trabalhar.
Este achado fez-me lembrar a história de uma menina, que vos vou contar,
qualquer semelhança com uma realidade distante, talvez não seja pura
coincidência.
Era uma vez (porque é assim que começam as histórias, não é?) uma menina
que foi com a sua Mãe visitar uma vizinha que estava muito doente.
Quando lá chegaram, já lá estava a patroa da vizinha e a filha, que era sua
colega da escola.
A filha da patroa convidou-a para ir para o pátio brincar, mas a menina não
quis ir, ela insistiu e perante a recusa, gritou:
- Ó mamã a rapariga da Maria do Rosário não quer brincar comigo.
A Mãe da menina ao ouvir pegou-lhe na mão e despediu - se, dizendo que
estava na hora de tratar do gado.
Pelo caminho foi perguntando a razão da recusa, a menina lá lhe foi dizendo
que não gostava da colega, que ela nunca lhe emprestava os lápis de cor e que
era muito vaidosa, que não brincava com todas as colegas só porque era rica.
Com toda esta conversa, chegaram a casa, onde já estava o Pai da menina a
quem a Mãe contou o que se tinha passado.
O Pai pegou-lhe ao colo, sentou-a nos joelhos e disse-lhe:
- Nunca mais quero que digas que não gosta de uma colega porque ela é rica,
podes dizer que não gostas porque ela é má para ti, mas que é rica, não.
- Tu não tens culpa de nasceres numa família pobre, ela não tem culpa de
nascer numa família rica, e não quero nem sonhar que algum dia tens inveja de
alguém.
Ela pode ser rica, ter tudo lá em casa, mas se calhar o pai dela não tem
vagar para a sentar no colo e contar-lhe uma história, como eu faço quase todos
os dias, portanto toma bem sentido no que eu te estou a dizer.
A menina ouviu, fixou, guardou para toda a vida.
Cresceu e nunca teve inveja de ninguém, nem sabe o que é esse sentimento,
mas quando raramente se encontra com a tal colega, lembra-se sempre das vezes
que gostava de poder pintar um desenho e ela não lhe emprestava os lápis de
cor, das lágrimas que chorava quando ela levava brinquedos lindos para a escola
e não a deixava brincar.
Pensando bem, perdoar, vá que não vá, mas esquecer, não faz parte da tal
conversa do Pai.
Afinal, acabou a história e são apenas lápis de cor.
Mas ninguém é igual a ninguém.
Outra menina que vivia em Angola, mas de vez em quando, estava cá uma
temporada, ia para a escola, gostava de brincar com todas, emprestava tudo o
que tinha (e tinha tudo o que era bom e bonito) e quando se ia embora dava-me
todo o material, inclusive a primeira mala da escola que tive, até aí era um
saco de ganga, feita do resto de umas calças.
Que bom ter encontrado estes lápis.
Como é que não hei-de agradecer todos os dias a família que Deus me
destinou.



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