Lavadeiras

 Hoje quando passei junto ao rio lembrei - me das memórias que partilhei ontem.

Tinha chovido muito ele ia quase cheio.

Este ano está muito diferente.

A diferença não é só por motivo das obras é também pela seca que se faz sentir.

Ao vê - lo pensei que se ele falasse teria tantas histórias para contar.

Sobre os peixes que abundavam nas suas águas cristalinas antes de chegar o chamado progresso, mas isso é outro "departamento". Agora vinha falar principalmente de quando a chuva era muita e as suas margens transbordavam.

As cheias do Arneiro, quando a família do Ti Alfredo Calor tinha que sair pelo telhado.

O jovem que morreu afogado na Ponte Sarjedas, as casas de banho públicas no tempo da Ti Jóia, que ficavam quase submersas.

A carrinha de um motorista do Isidoro Duarte que passou por baixo da ponte grande e foi parar na ponte dos tanques, graças a isso, teve que ser feita uma nova ponte, etc, etc.

Tanta vida que existe naquele rio que faz parte da vida, de quem nasceu e cresceu sempre na sua companhia.

Como ele não sabe falar, eu vou partilhar uns versos que escrevi sentada na sua margem, enquanto o meu Pai tratava da horta e a minha Mãe lavava a roupa das patroas.

Eu estava farta de ouvir as conversas das mulheres que iam lavar a roupa e não conseguiam lavar a língua, resolvi escrever para "memória futura".

Mal imaginava naquele tempo, que depois de tantos anos estava aqui, muito bem sentada em casa, em frente a uma geringonça onde se "lava roupa “da mesma maneira que se lavava à sessenta anos no Rio.

Pois é afinal é pela língua que morre o peixe.


As lavadeiras
 
Fui brincar para o Açude
Pus-me a ouvir as lavadeiras
E já fiquei a saber
O que são as codrilheiras
 
Todos os dias do ano
Servem para dizer mal
Começam no ano novo
E vão até ao natal
 
Porque uma não arruma a casa
O outro falta ao trabalho
E outra que ficou a dever
A carne ao homem do talho
 
Um porque joga à batota
Outro bate na mulher
E o filho de fulano
Só trabalha quando quer
 
Uma tem a saia curta
A outra nem usa lenço
Com esta conversa toda
Eu já não sei o que penso
 
 
Fulana que já está velha
É tratada por menina
Tem a mania que é rica
São coisas de gente fina
 
A filha da outra ao lado
Em vez de andar a brincar
Ainda mal deixou as fraldas
E já pensa em namorar
 
Nem o dono da taberna
A elas vai escapar
Dizem que engana os fregueses
Tem a balança a roubar
 
Algumas vão para a missa
Mas não sei porque razão
Dizem que o dinheiro das esmolas
Metade é para o sacristão
 
Até dizem que os festeiros
Roubam o dinheiro da festa
E que a mulher do patrão
Lhe anda a enfeitar a testa
 
Conseguem falar de tudo
Dos direitos fazem tortos
Até enterram os vivos
E desenterram os mortos
 
Não se pode ser mordomo
Aqui nesta freguesia
Não param de dizer mal
Passam assim o seu dia
 
Já estou a ficar cansada
Estou farta de as ouvir
Vou escrever num papel
Para mais tarde me rir

É isto meus amigos, mais uma folha do meu caderno.
Mais uns pedaços da minha vida que partilho convosco.


Espero que estas patetices sirvam para vos ajudar a aliviar a pressão que paira sobre todos nós.
Não está fácil combater este inimigo traiçoeiro e invisível, mas com coragem e esperança, todos juntos fazendo o nosso melhor, vamos conseguir.
Um bom resto de dia para todos, com saúde e paz.
Aqui vos deixo uma foto de hoje para comparar com a do ano passado.


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